Curiosidades da produção de Carrie, a Estranha

O primeiro livro de Stephen King e sua primeira adaptação aos cinemas, Carrie, a Estranha permanece um dos filmes mais icônicos do terror. Confira o baile de curiosidades sobre a produção.

Entre os monstros clássicos que o estúdio Hammer ressignificava, tubarões assustadores, famílias canibais e crianças possuídas e endemoniadas, uma garota pálida e isolada por seus amigos de classe emergia nos anos 1970 e se tornava um dos maiores ícones do terror. O lançamento de Carrie, a Estranha, em 1976, não apenas mudaria para sempre a carreira de Stephen King, mas também ajudaria a criar uma nova tendência para o terror.

Na história, Carrie (Sissy Spacek), uma jovem que vive isolada com sua mãe, uma mulher fanática religiosa e que não deixa sua filha conhecer nada além do que ela acredita ser correto, acaba sofrendo uma série de bullying na escola. Ao ser convidada por um garoto popular ao baile, Carrie pensa que pode ter um momento como uma garota normal, até que eventos traumáticos despertam na jovem poderes telecinéticos capazes de acabar com a cidadezinha onde vive.

Imagem de Carrie, a Estranha (1976).

Se hoje os filmes de garotas que revidam, se vingam, e não aguentam as coisas caladas como vítimas passivas diante de situações ultrajantes é um dos “subgêneros” mais queridos dentro do terror, muito se deve à Carrie White e os acontecimentos daquela noite no baile da escola. O filme de Brian De Palma, com roteiro adaptado por Lawrence D. Cohen a partir do livro de mesmo nome de King, lançou luz sobre essa personagem e essa história trágica e, de certa forma, catártica para vários adolescentes acostumados a estarem à sombra dos garotos populares.

Clássico absoluto e que recebe menos crédito que deveria, a Macabra reuniu algumas curiosidades da produção de Carrie, a Estranha.

O primeiro passo para o estrelato

A mente por trás de Carrie, a Estranha: Stephen King.

Muitos sabem que Carrie foi o primeiro livro e primeiro grande sucesso de Stephen King, e já ouviram como Tabitha King salvou a história do lixo, onde o mestre do terror a havia jogado por não ter gostado de seu conteúdo. King já escrevia naquela época, contos e histórias para revistas pequenas, mas foi Carrie que inaugurou a grande carreira de King.

Porém uma parte da história menos divulgada foi que, aos 26 anos, King recebeu apenas 2500 dólares pela compra dos direitos. Hoje, esse é um valor irrisório. Na época, apesar de uma soma interessante para um jovem escritor, ainda assim era um preço bem abaixo do esperado. Mas King agradece por ter tido essa experiência com seu primeiro livro. Em uma entrevista em 2010, em uma leitura em Port Charlotte, na Flórida, King comentou que se sentia muito afortunado por, em seu primeiro livro, ter conseguido uma adaptação. 

A direção

Sissy Spacek e Brian De Palma no set de Carrie, a Estranha.

Diferente do que costuma acontecer com grandes estúdios, que acabam escolhendo os diretores que serão contratados para seus filmes, foi o próprio Brian de Palma que se interessou por Carrie. De Palma foi apresentado à história de Carrie White por um amigo escritor, que lhe falou sobre o livro de King. Isso ainda em 1975, apenas um ano depois do lançamento oficial do livro nos Estados Unidos. Imediatamente interessado em adaptar a história para o cinema, De Palma conseguiu encontrar os detentores dos direitos.

Piper Laurie e Brian De Palma no set para a gravação de uma das maiores cenas de Carrie, a Estranha.

Naquela época, o cineasta já havia dirigido alguns curtas e longas, como Irmãs Diabólicas (1972), O Fantasma do Paraíso (1974) e Trágica Obsessão (1976). Mas todos com orçamentos relativamente baixos, e, em sua maioria, financiados de forma independente. Carrie, por exemplo, custou 1 milhão e 800 mil dólares para ser feito. Apesar de seus filmes anteriores terem recebido boas críticas e fechado suas exibições com lucros, Carrie acabou sendo um grande sucesso. 

Depois de Carrie e alguns outros sucessos que se saíram razoavelmente bem entre a crítica, De Palma firmou sua carreira como diretor consagrado com Scarface, em 1983.

O roteiro

O escolhido para adaptar o livro de King para o filme de De Palma foi Lawrence D. Cohen. Relativamente novo no ramo àquela altura, Cohen havia escrito somente dois roteiros antes de Carrie, a Estranha: Sedgewick Hawk-Styles: Prince of Danger (1966), um filme para televisão dirigido por William Asher, o famoso produtor e diretor de séries como I Love Lucy e A Feiticeira; e Italianamerican (1974) de Martin Scorsese, um documentário onde o diretor entrevista seus pais e suas vidas em Nova York como imigrantes.

Lawrence D. Cohen, roteirista de Carrie, a Estranha e outras adaptações de King.

Mas Carrie parece ter conferido um novo gosto à carreira de Cohen. Depois desta, várias outras adaptações de King entraram no currículo do roteirista. Dentre elas, a adaptação da minissérie de 1990 It – Uma Obra Prima do Medo, ao lado de Tommy Lee Wallace, diretor; a minissérie The Tommyknockers (1993); o quarto episódio da minissérie Pesadelos e Paisagens Noturnas (2006), intitulado “The End of the Whole Mess”; e até mesmo a adaptação mais recente de Carrie, a Estranha, dirigida por Kimberly Pierce e lançada em 2013. 

Além de Stephen King, Cohen também roteirizou a adaptação de Ghost Story, de Peter Straub, bom amigo do mestre do terror, que foi lançada em 1981.

O papel de Carrie White

Imagem de Carrie, a Estranha (1976).

Escalar os papéis principais de adaptações é sempre um trabalho árduo. A personagem de Carrie White difere ligeiramente do livro, onde é descrita como acima do peso, com espinhas em seu pescoço e costas e um rosto oleoso com cravos. Se pegarmos a imagem que temos de Carrie no filme de 1976, algumas dessas características serão perdidas. Entretanto, a escolha de Sissy Spacek, que interpretou o papel de Carrie White com desenvoltura, parece mais que acertada. Spacek deu vida à personagem do livro com toda a força que a personagem merecia.

Imagem de Carrie, a Estranha (1976).

Mas Spacek não era a primeira opção de De Palma como Carrie White. Betsy Slade, que havia recebido boas críticas por seu papel no filme Our Time (1974) era o nome favorito para viver a protagonista, mas o marido de Spacek, o designer de produção e diretor Jack Fisk, convenceu De Palma a deixar Spacek fazer uma audição como Carrie. Contam que Spacek estava realmente determinada a conseguir o papel, passando vaselina no cabelo, chegando ao teste com o rosto sujo e um vestido de marinheiro que sua mãe havia lhe feito na sétima série, com a bainha por fazer. A presença e leitura de Spacek convenceu De Palma e o restante da produção, e a atriz ficou com o papel. 

Depois de Carrie, Spacek retornaria a uma produção adaptada de Stephen King na série Castle Rock.

Um filme de terror? Imagina!

Piper Laurie como Margaret White, a mão fanática religiosa de Carrie.

Até seu falecimento, em outubro de 2023, Piper Laurie seguia acreditando que Carrie, a Estranha, era na verdade um filme de sátira, uma comédia absurda. Quando foi escolhida para viver o papel de Margaret White, a atriz simplesmente não conseguia se levar a sério lendo suas falas e vestindo seu figurino.

Em meio a diversos rompantes de gargalhadas, ela dizia que achava tudo muito “exagerado”, e tinha certeza que ninguém levaria a sério. Mesmo depois de De Palma ter conversado com ela pessoalmente e dito que se tratava de um filme de terror, Laurie não conseguia acreditar que seu papel deixaria alguém aterrorizado.

Nancy Allen e John Travolta nos papéis dos valentões do colégio e inimigos de Carrie Chris Hargenson e Billy Nolan.

Da mesma forma, John Travolta e Nancy Allen, que interpretam os dois piores valentões da história — Billy Nolan e Chris Hargenson — não sabiam que seus personagens seriam tão perversos até verem os cortes finais do filme. Allen afirmou que, enquanto interpretava, achava que os dois seriam, até certo ponto, o alívio cômico da produção. Foi realmente um choque assistir ao filme finalizado e perceberem que eles eram os grandes inimigos de Carrie White.

Carrie ou Star Wars?

Nos anos 1970, vários cineastas de filmes de gênero eram amigos próximos e visitavam os sets de filmagens uns dos outros. Conhecemos a história de quando Martin Scorsese, George Lucas e John Milius foram visitar o set de Tubarão, para Spielberg apresentá-los a Bruce, o boneco que serviria de terror das praias de Amity Island. 

Mas George Lucas também era um bom amigo de Brian De Palma, e sugeriu que eles fizessem as audições de Star Wars e Carrie, a Estranha juntos. Isso, claro, não poderia dar muito certo. Na audição, De Palma gostou de Amy Irving para Carrie, mas Lucas havia gostado dela para Leia, em Star Wars. William Katt também esteve na audição e fez o teste para ambos os filmes. Irving acabou indo para Carrie, no papel de Sue Snell, e Katt foi escolhido por De Palma para o papel de Tommy Ross.

Sequência, remake e musical

Carrie, a Estranha se tornou um sucesso e ainda hoje é grande referência aos fãs do terror. Sendo assim, é claro que muitos tentaram reproduzir seu sucesso ao longo dos 48 anos em que o filme foi feito. A obra já conquistou dois remakes, um musical e uma sequência — nenhum deles, entretanto, conquistou muitos fãs.

A primeira tentativa foi o musical Carrie: The Musical, onde Lawrence D. Cohen, roteirista do filme original, se uniu ao compositor Michael Gore para transformar a história de Carrie White para os palcos da Broadway. A peça estreou em 1988, mas não resistiu nem a cinco apresentações. Hoje é conhecido como um dos maiores fracassos da famosa avenida de espetáculos e teatros em Nova York. Alguns fãs surgiram ao longo dos anos, e foi utilizado em 2018 pela série Riverdale como base de um de seus episódios musicais.

Imagem de Carrie: The Musical, de 1988, com Linzi Hateley no papel de Carrie e Betty Buckley como Margaret White.

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Em 1999, foi a vez de apostarem em uma sequência. Intitulada A Maldição de Carrie no Brasil, poucos se lembram que o filme existe, e não podemos afirmar que tenha sido um grande sucesso, mas houve um esforço da produção para trazer Amy Irving, a Sue Snell do filme original, para uma aparição especial no filme. Dirigido por Katt Shea e Robert Mandel, o filme acompanha a personagem Rachel Lang (Emily Bergl), que, assim como Carrie, possui poderes telecinéticos. 

A Maldição de Carrie, de 1999.

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Indo para 2002, Bryan Fuller tinha um plano ousado: transformar Carrie em uma série de TV. O primeiro episódio seria um filme feito para TV, com direção de David Carson e Angela Bettis no papel de Carrie. Enquanto o filme de 1976 teve que deixar vários detalhes do livro de fora por questões orçamentárias, a produção de Fuller tentou se manter o mais próximo possível dos acontecimentos da história escrita por King. Mas, com a intenção de fazer uma série após o filme, algumas mudanças no final acabaram afetando a resolução do enredo. Apesar de ter se saído muito bem com a audiência televisiva, a série nunca foi feita.

Carrie, a Estranha, filme para TV de 2002.

E, em 2013, já no final da tendência de remakes dos filmes de sucesso dos anos 1970 e 1980, a diretora Kimberly Pierce assinou seu remake de Carrie, trazendo Cohen para ser roteirista do projeto, com Chloe Grace Moretz no papel de protagonista. Mas, o que era para ser uma adaptação moderna do texto de King, não acabou se saindo como o esperado. 

Carrie, a Estranha, de 2013.

Até o momento, depois de pouco mais de dez anos, ainda não ouvimos falar em uma nova adaptação de Carrie. Mas, levando em consideração tantos remakes de adaptações de Stephen King, pode ser apenas uma questão de tempo para que surja um novo projeto.

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Acordo cedo todos os dias para passar o café e regar minhas plantas na fazenda. Aprecio o lado obscuro da arte e renovo meus pactos diariamente ao assistir filmes de terror. MACABRA™ - FEAR IS NATURAL.